O setor de óleo e gás passa por um momento de transformação no Brasil. Com a retomada do desenvolvimento das reservas do pré-sal, a expectativa é que o país mais do que dobre sua produção de petróleo na próxima década. Esse novo cenário impacta diretamente nas tomadas de decisões estratégicas e na composição da liderança que deve estar à frente dos negócios nesse momento e nos próximos meses. Abaixo listamos 9 fatos para guiar as tomadas de decisões nos próximos meses.

Por Thiago Pimenta e Saulo Ferreira

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O mercado de petróleo e gás natural no Brasil passa por um momento de
transformação. As perspectivas quanto a volume e exploração e produção (E&P) são grandes. Hoje, são produzidos, em média, 3 milhões de barris de petróleo por dia no país, porém a expectativa é que esse montante mais do que dobre nos próximos 10 anos, segundo dados da Agência Nacional de Petróleo (ANP). Essa perspectiva é consequência do desenvolvimento das reservas do pré-sal.

Descobertas no final de 2006, as reservas do pré-sal tiveram a sua exploração prejudicada em 2014, principalmente pelas cotações da commodity, contextos políticos internos e mudanças no marco regulatório brasileiro relacionadas ao modelo de partilha dos blocos. Além disso, a indústria tem uma grande barreira de entrada por questões regulatórias e a necessidade de alto investimento (Capex). É importante lembrar, ainda, que a agenda de desinvestimento da Petrobras e a nova regra de participação da companhia no pré-sal têm atraído players internacionais, adquirindo campos maduros e participando de leilões de áreas relevantes.

Vale destacar também os avanços na regulação do gás natural e as perspectivas para o mercado de refino de petróleo no país, especialmente considerando a dinâmica dos preços dos derivados praticados pela Petrobras, acompanhando as cotações internacionais, que já trouxeram uma nova realidade para o setor.

Com base nesses movimentos e em conversas com executivos do setor de óleo e gás, destaco a seguir nove pontos de atenção relacionados a E&P (upstream) e refino (downstream). São aspectos que os decisores da cadeia devem ter no radar ao formatar suas estratégias de negócio para os próximos meses.

9 fatos para guiar
as tomadas de decisões nos
próximos meses

1. A corrida por custo é real em E&P

Temos visto uma grande corrida por eficiência operacional. Como comentei anteriormente, o Capex é alto. Além disso, os investimentos são de longo prazo e vivenciamos um mercado com preço médio do petróleo em queda. O cenário demanda uma gestão austera, especialmente no desenvolvimento de novos e desafiadores projetos.

2. A tecnologia ganha destaque nas estratégias do negócio

Do ponto de vista tecnológico, tenho percebido grandes avanços na cadeia. Em algumas companhias, os executivos estão repensando o modelo de atuação para se enquadrarem no novo ponto de equilíbrio por barril. Já na indústria de fornecedores há um crescente investimento em soluções tecnológicas disruptivas que contribuam para as pesquisas e a melhoria dos processos como um todo, incluindo reduções de prazos, maior eficiência na perfuração de poços, novas tecnologias na gestão das plataformas, consórcios e parcerias para troca de know-how.

3. Há particularidades na demanda por mão de obra em E&P

Minha percepção é que as equipes estão bem enxutas para o portfólio atual. Nesse cenário, a tendência é que, para otimizar os investimentos, as empresas estrangeiras optem por compor a equipe gerencial com profissionais do Brasil e busquem apoio em profissionais expatriados para fazer a transição inicial, em um período de um a três anos. Em conversas com executivos do upstream, identifiquei companhias que adquiriram campos maduros mesmo com um time reduzido e, para operarem esses ativos, precisarão reforçar as estruturas, especialmente em posições operacionais para o acompanhamento da gestão das plataformas e também nas áreas de suporte ao negócio, especialmente na área tributária. Além disso, outros players que adquiriram blocos do pré-sal com grande capacidade de produção também têm planos de expandir a operação à medida que crescerem as ações de exploração. Também vale destacar todo o ecossistema de fornecedores, que hoje atua com estruturas reduzidas e será diretamente impactado com o aumento de produção e consolidação dessas companhias.

4. O texto-base do marco regulatório do gás natural está aprovado

Em breve, o Senado deve analisar o novo marco regulatório do gás, aprovado recentemente pela Câmara dos Deputados. O Projeto de Lei 6.407/2012 tem o objetivo de proporcionar a oferta de gás natural a menores preços para a indústria, o comércio e os consumidores em geral.

5. O mercado de refino de petróleo começa a ser aberto

Outra grande mudança que observamos acontece no mercado de refino de petróleo no Brasil. Enquanto em E&P o mercado foi aberto em 1997 para outros atores, especialmente estrangeiros, no refino a Petrobras segue como protagonista, quase com monopólio do mercado nacional. Porém, a venda de oito das 13 refinarias existentes no Brasil abrirá o mercado. Vale destacar que esses ativos correspondem a quase 50% da capacidade de refino do país.

6. O mercado de trabalho do refino de petróleo está permeado por desafios e oportunidades

É grande a demanda por engenheiros e profissionais de perfuração no upstream, que conta com muita mão de obra qualificada, se comparado ao refino. O alto nível de qualificação desses profissionais se deve ao fato de muitas companhias estrangeiras, atuantes no mercado nacional desde a abertura, em 1997, terem a cultura de valorizar a formação técnica, estimulando o desenvolvimento acadêmico e as experiências internacionais em operações e mercados mais maduros. Quando falamos da formação de equipes no refino, mesmo trazendo expertise do exterior, as grandes empresas precisarão contratar e formar profissionais locais. Vale destacar a carência geral do mercado pelo profissional de comercialização de petróleo cru, principal insumo de uma refinaria. Basicamente, essa posição e outras relevantes na cadeia de refino existem apenas na Petrobras.

7. A competitividade no mercado tende a aumentar bastante

Hoje, a Petrobras ainda está sujeita à influência governamental na determinação do preço dos derivados. Com a venda das refinarias, o poder de controle do Estado vai diminuir bastante. Claro que os avanços e a competitividade dessa indústria também dependem de mudanças tributárias. Hoje, a estrutura brasileira de impostos ainda prejudica a atividade de compra e venda (trading) de petróleo no país: o modelo foi estruturado para a operação da Petrobras; a produção e o parque de refino estão sob a gestão de um mesmo grupo, estimulando produtores de petróleo locais à exportação; e a venda no mercado interno onera tributariamente as operações. O desenrolar desse tema também é preponderante para a atração de outros distribuidores e novas mesas de derivados e petróleo, entre outras empresas interessadas em desenvolver o mercado, gerando impactos nas oportunidades em trading, logística, tancagem, movimentação rodoviária, terminais e portos.

8. A Covid-19 desacelerou a indústria

O ano de 2020 está sendo atípico para todos os setores. Nesse cenário, a velocidade do desenvolvimento do setor de óleo e gás está muito prejudicada, incluindo exploração e produção, transporte, refino e varejo. No upstream, muitas das agendas de investimento foram postergadas pela ANP, o que, de alguma forma, impacta na retomada do setor e da cadeia como um todo. No chamado downstream, a forte queda a demanda por produtos derivados reduziu o volume de produção, além de postergar os leilões que estavam previstos para acontecer no primeiro semestre.

9. Trata-se de uma indústria transitória

Segundo a Agência Internacional de Energia (IEA), o petróleo deve diminuir sua participação na matriz energética global. É claro que essa transição se dará ao longo de décadas, desenvolvendo outras fontes renováveis. Para grande parte dos players internacionais, o petróleo é transitório. Nessas organizações, existe uma agenda de investimento em outras fontes, o que faz com que elas deixem de ocupar papel de destaque na indústria de óleo e gás para se tornarem companhias internacionais de energia. Nesses casos, as empresas comprometem-se, inclusive, com a redução de carbono em suas cadeias produtivas ao longo dos anos seguintes. Todo esse cenário, de alguma forma, impacta diretamente na carreira de muitos executivos que se formaram com base em uma estratégia mais tradicional. Nesse cenário, a capacidade de atualização e aprendizagem já é um fator crítico na avaliação e formação de novos líderes.


A indústria de óleo e gás, apesar de transitória, ainda é essencial. As mudanças reais se darão décadas a frente. Hoje, o contexto traz oportunidades para a cadeia como um todo. Os juros baixos e a maior liquidez no mercado internacional atraem investimento para projetos na “economia real”, especialmente considerando a demanda internacional por petróleo, estimulada pela China, além da demanda nacional de derivados.

Localmente, frisa-se que as iniciativas estratégicas no setor energético no Brasil ainda são consideradas tímidas em termos de transição para energia renovável, com pouco (ou nenhum) estímulo para que, por exemplo, a frota de automóveis migre para uma motorização elétrica. Talvez essa timidez se dê em função do modelo de arrecadação governamental, que ainda é muito dependente da produção de petróleo e gás. Isso, seja por meio do montante obtido pelos leilões de concessão para exploração de campos ou de tributos, como royalties e participações especiais. Todos esses fatores fortalecem a relevância do setor de óleo e gás no Brasil para as próximas décadas.

Os ativos da Petrobras – campos maduros e refinarias -, além dos blocos do pré-sal, chamam a atenção de grandes players internacionais, movimentando agendas de IPOs, fundos de investimentos e consolidação das companhias que já estão no país. Os avanços na legislação, representando um marco regulatório claro, são fundamentais para a estratégia de expansão desses investidores.

É nesse ambiente seguro que muitas perspectivas adormecidas desde 2014 terão espaço para serem desengavetadas, projetando o país entre os grandes produtores globais.

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